Os meus óculos de sol partiram-se. Não consigo andar na rua sem óculos! Não consigo conduzir sem os óculos! O sol faz-me imensa confusão aos olhos. O certo é que resolvi enfiar-me num shopping. Péssima ideia! Isto porque tive sensivelmente uns 20 minutos só para arranjar lugar. (Fez tudo greve pois estava a pinha o raio do shopping)
Já estava com a neura por levar tanto tempo a arranjar lugar que vou objectivamente à loja que queria para então comprar os malditos óculos. Experimenta daqui, experimenta dali e às tantas perdi a conta dos quantos modelos que experimentei. O certo é que nada levei. Fiquei pior que ursa. É o que dá ter um rosto pequeno, não dá qualquer modelo. Oh sorte a minha, bolas...
Como fazia um calor jeitoso (o ar condicionado da loja devia estar avariado, só pode!) decidi ir comer um gelado. Sentada na parte da restauração lá a Essência saboreava o bendito gelado que soube-me pela vida e pus-me a pensar porque raio não tinha um rosto que dava para todos os modelos de óculos e tudo mais... envolta no gelado e nos pensamentos sou abruptamente interronpida por um choro compulsivo. Choro esse que era de uma criança (menina) que estava à minha frente a umas poucas mesas de mim. Nem os murmurinhos típicos de um shopping cheio desfarçou aquele choro... automaticamente tirei o sentido dos meus pensamentos e no gelado e centrei-me naquela mesa. Isto porque o vi e ouvi a seguir assim o ditou!
Na mesa estava a menina, o pai e supostamente a namorada, companheira o que for. A menina chorava (provavelmente por algo que queria) mas o que me chocou foi a atitude do pai tanto em palavras como em acções.
Frases soltas do senhor:
- Estou farto!!
- Sabes o que a tua mãe está a fazer neste momento?? Está a namorar!! E tu estás aqui a encher-me a cabeça!
- Estou farto!!
- Pára de chorar! Já não te posso ouvir!! (Isto proferido em alto e bom som!!)
A menina lá dizia umas quantas coisas que sinceramente não percebia nada (entre soluços) pois o pai tinha que se chegar muito perto para a conseguir ouvir. A senhora que estava ao lado só se limitava a olhar para eles como para os lados e comer. E assim ficou pávida e serena o tempo que lá permaneceram. O homem estava completamente descontrolado e às tantas como a menina (não devia ter mais de 10 anos) não parava de chorar agarra-a pelo bracito e abana-a toda o que fez o choro ficar mais audível e a menina, ela toda tremia. E continua com as frases soltas:
- Vens estar comigo para isto?
- Queres pôr-me maluco?
- É a tua mãe que diz-te para comportares assim?
- Estou farto disto!!
-Estou farto!!
A senhora lá disse alguma coisa que eles se levantaram da mesa e ele agarrou a menina a soluçar compulsivamente pelo bracito e foi a toque de caixa e a frase solta que ouvi até deixar de os ver foi:
- Estou farto disto!!
Cena mais explícita dos casais separados que os filhos andam ao sabor do vento dos ditos pais...
Pergunto: O que interessava a criança ouvir aquelas questões do pai? O que a criança poderá responder com lógica a um adulto perante aquelas perguntas? O que vai mudar? O que já está como dado adequirido, a separação! Como o facto da criança ter que estar com o pai e com a mãe separadamente. O que ganhou aquele pai magoar a filha como se quisesse magoar a mãe que ali não estava? Há certas e determinadas atitudes que me transcendem, confesso que sim. Por mais que tente efectivamente entender é tudo muito à frente do racional como do razoável. Desta fantochada toda que vi na mesa ao lado e que me deixou com o coração apertadinho foi ver os olhinhos daquela menina inocente que não pediu aquela situação, foi de pura tristeza. Muita tristeza naquele olhar...
A atitude grosseira, rude e desiquilibrada daquele pai. A passividade serena daquela senhora ao compactuar com aquele distúrbio todo. Foi isso que chocou-me e deixou a pensar que com certeza como aquela menina outras e outras estão numa situação igual ou pior. Como também pensei: se em público é assim como será em privado?