Os dias têm acordado frios e cinzentos, sempre com gotas de chuva a molharem os vidros das janelas. Olho para o horizonte de chumbo. Mais uma vez a chuva cai lá fora, sem descanso. As cores esbatem-se na ausência do brilho do sol e do azul do céu. Pequeninas gotas de chuva fria deslizam no padrão disforme do vidro molhado. Juntam-se e separam-se...tornam-se maiores e desaparecem. A intensidade da chuva aumenta. Ninguem pode decidir o momento em que surge ou quando irá parar. Resta esperar. Uma espera sufocante...tanto lá fora como cá dentro, onde a chuva fria gela até a alma. Apetece-me sair. Andei muito para chegar aqui, mas continuo a andar em círculos para ir ter ao mesmo sítio. Precisamente ao ponto de partida. Olho para o caminho à minha frente e de repente vejo surgir ao longe alguém que está a percorrer o mesmo caminho já percorrido por mim, enfrentando os mesmos desafios do percurso. Tento alertá-lo para o obstáculo que se encontra mesmo à sua frente, mas não me ouve e cai. Cai e volta a cair, mas levanta-se, não desiste. Continua a chover. Concentro-me nas gotas de água que caem lá fora, procurando em pleno exercício de meditação esvaziar a cabeça, parar o pensamento e espreitar a mente colocando-me no papel de um observador isento de si mesmo, sem julgamentos. Está difícil. A mente não pára, volta sempre ao mesmo ponto de partida. Perco-me...da mesma forma que já me perdi um dia, no meio de rostos vazios e inexpressivos. Percorri mais uma vez o mesmo caminho de sempre, sem saber onde ia. Nesse dia a chuva acompanhou-me, tal como hoje. Sempre tão fria, cinzenta e inexpressiva - tudo o que mais detesto...Mas ninguém me perguntou nada.
Entretanto continua a chover lá fora e cá
dentro. Sem descanso. Gotas de água e ár
sufocante que culminam com o barulho dos
trovões a confundir-se com o barulho do coração.